A Folha de São Paulo de hoje trouxe uma reportagem do Ricardo Gallo, abaixo reproduzida (fonte: Aeroclipping do SNA), sobre a instalação do ILS Cat-3A em Cumbica. Leiam-na, que eu comento em seguida.
Sistema antineblina de Cumbica servirá só para 30% dos voos
Equipamento estimado em R$ 9 milhões começa a funcionar no inverno, mas empresas resistem ao uso
Empresas nacionais, que respondem por 70% das operações, não estão credenciadas para utilizar o mecanismo
RICARDO GALLO
DE SÃO PAULOAo custo de R$ 8,9 milhões, o sistema antinevoeiro prestes a entrar em operação no aeroporto internacional de Cumbica, em Guarulhos (Grande São Paulo), atenderá a minoria dos voos e será usado raramente –pouco mais de um dia a cada ano.
Chamado de “ILS (sistema de pouso por instrumentos, na sigla em inglês) categoria 3a”, o equipamento estará em funcionamento neste inverno, disse a Infraero, estatal que o comprou e o instalou.
A maioria dos passageiros que usa Cumbica não será beneficiada pelo equipamento.
Isso porque usar o antinevoeiro requer que as companhias aéreas tenham aviões certificados e pilotos treinados –o que TAM, Gol, Azul e Avianca Brasil não têm.
Elas são responsáveis por 70% dos voos no aeroporto.
Assim, quando houver nevoeiro em Cumbica, o que deve ocorrer principalmente no mês que vem, os voos dessas empresas terão que ser desviados para outros lugares.
A justificativa das empresas é o custo: treinar pilotos para o ILS 3 é caro e exige treinamento contínuo.
Em Cumbica, que fecha cerca de 40 horas (0,4% do ano) ao ano por causa da neblina, o investimento não compensa, diz Ronaldo Jenkins, diretor da Abear, associação que reúne TAM, Gol, Azul e Avianca.
As maiores companhias, diz ele, são habilitadas para o ILS 2, na qual os pousos ocorrem com visibilidade horizontal mínima de 350 m e permitem operar na maior parte do ano em Cumbica.
O novo equipamento do aeroporto permite ao avião pousar com visibilidade de 175 m à frente, mesmo sem o piloto enxergar o chão.
ESTRANGEIRAS
Serão beneficiadas as companhias aéreas americanas e europeias, que, por atuar em condições climáticas adversas em seus países de origem, são certificadas para usar o equipamento. A alemã Lufthansa, por exemplo, afirmou que está apta a fazê-lo.
Na Europa e nos Estados Unidos está em discussão a adoção de outras tecnologias como alternativa ao ILS 3, considerado caro, com o uso de satélites para ajudar o avião a pousar, em vez de aparelhos no solo.
As companhias brasileiras são favoráveis a essas opções, disse Ronaldo Jenkins.
A Anac informou que os requisitos para o sistema antinevoeiro funcionar ainda não foram cumpridos integralmente para liberar o seu uso.
A implantação atrasou: a própria Infraero previa que ela ocorresse em dezembro de 2011, um ano e meio atrás.
OUTRO LADO
Infraero não se manifesta sobre novo equipamento
DE SÃO PAULOA Infraero não se manifestou sobre o fato de o equipamento de R$ 8,9 milhões atender a uma pequena parte dos voos de Cumbica.
A Folha enviou questões à estatal anteontem à noite.
À reportagem um dirigente da companhia mostrou insatisfação com o fato de as companhias aéreas não treinarem tripulações para usar o equipamento antineblina.
A TAM informou que está em processo de pedir à Anac aval para usá-lo nos seus aviões maiores, que fazem rotas intercontinentais (Boeings 767 e 777 e Airbus A330), assim como treinar as tripulações a fazê-lo.
A Gol informou que aguardará a implantação do ILS 3 antes de se manifestar. Em janeiro de 2012, a empresa havia dito à Folha não ter interesse em adotá-lo, pois seus aviões são autorizados a usar o ILS 2, tido como suficiente.
A Azul diz que tem interesse em habilitar parte da frota. A Avianca não respondeu.
Comento
Eu respeito o jornalista Ricardo Gallo, que reputo como um dos melhores profissionais que cobrem a aviação atualmente na imprensa “genérica” nacional. Mas, desta vez, eu acho que ele errou a mão na reportagem, que no meu entender, passa a mensagem de que a instalação do sistema foi desnecessária e que as companhias nacionais estão atrasadas no uso da tecnologia – pelo menos, esta foi a minha impressão ao ler o texto.
O que eu acho que deveria ter sido evidenciado é que, até o momento, nenhum aeroporto do Brasil ainda possui o ILS Cat-3A, Cumbica será o primeiro. Desta forma, nada mais natural do que não haver aeronaves homologadas e tripulação habilitada para tal operação em nosso país! Ora, assim sendo, é claro que, em um primeiro momento, somente as companhia estrangeiras, que respondem por cerca de 30% do movimento do aeroporto, possam utilizar o novo sistema. Não há nada de errado nisso, as companhias não estão atrasadas tecnologicamente, e o investimento da Infraero faz sentido. Com o passar do tempo, com as companhias adquirindo novas aeronaves e reciclando o treinamento de suas tripulações, e eventualmente com outros aeroportos do país também implantando o ILA Cat-3A, essa situação deverá mudar naturalmente. Nada mais sensato e lógico do que isso, no meu entender…
Ah, e “sistema antineblina” também é duro de encarar, né? Tudo bem que a reportagem é voltada para o público não-especializado, mas o termo utilizado dá a entender que o ILS “espanta o nevoeiro”, o que é claro que não é o que ocorre.
Rodrigo Valsecchi
9 anos agoTb acho q ele falhou nesta reportagem, para que as empresas possam investir em treinamento, logicamente precisa ter o equipamento a altura nos aeródromos.
O brasileiro reclama que nao tem cat3A, quando tem reclama q gastaram 9 milhões!
Mas que sao 9 milhões para a Infraero? Pior é o dinheiro estar empacado por mais de um ano!!!!!
Marcelo
9 anos agoRaul,
Realmente a abordagem do jornalista foi péssima, é obvio que as companhias não tinham pilotos treinados para CATIII por não ter o equipamento em nenhum aeroporto no Brasil, a partir de agora as companhias começaram a treinar seus pilotos com certeza, ou será que elas preferem alternar um vôo de SBGR para SBGL ou SBKP e aumentar o custo de combustível?
Fábio Otero Gonçalves
9 anos agoA diferença do CAT II para o III reside – principalmente – nos requisitos de Manutenção, por envolver AutoLand mandatório. Então a Manutenção, Controle de CTM etc ficam mais rígidos. É preciso implementar um programa de acompanhamento (que não se esgota quando da homologação / aprovação), da mesma forma que tem-se que fazer para manter as outras certificações (i.e. ETOPS, RVSM, MNPS etc etc). Já trabalhei para um operador europeu, no Airbus A310-304, onde éramos aprovados para ILS CAT IIIb (em nosso caso, RVR de até 75 mts + Teto Zero e 125 mts de Visib para LVOPS, na Decolagem). Pela regra do JAR OPS (jhoje EASA), à época, tínhamos que fazer no mínimo 3 Autolandings por semestre, cumprindo os requisitos técnico-operacionais (i.e.aeronave e tripulação) do CAT IIIb, fosse o pouso efetuado em condições de ILS CAT IIIb ou não. Na verdade, são feitos mais para testar a integridade do sistema (i.e. dual coupled approach, self callouts adicionais, modos de retard/flare/rollout etc.). Tais pousos precisavam ser lançados no “Diário de Viagem” (ou o nosso “Livro de Bordo”, para o INAC Português) e também havia um “formulário de eventos”, que era preenchido e distribuído aos setores envolvidos, a cada vez que se efetuasse o treinamento. Caso o mínimo de 3 Autolandings fosse atingido, ao longo de um semestre, o treinamento poderia ser “waived” para o simulador daquele período. Caso contrário, treinávamos as aproximações que tivessem faltado. Não é mistério nenhum e nem custa tanto assim. Isso é balela. O problema maior é que as empresas brasileiras (mesmo TAM e GOL) hoje não possuem instrutores qualificados em CAT III, pq ninguém nunca fez, a não ser quem voou como expatriado. Teriam que qualificar instrutores e o material / equipamento de treinamento (inclusive os simuladores, que – além de serem “Level D” -, teriam que estar equipados para reproduzir as condições de CAT II e III, senão os “graphics” não correspondem ao visual experimentado em LVOPS, a seqüência de retard / flare / rollout não reflete a realidade etc.). Então, a autoridade teria que ir lá e aprovar o simulador também. Agora: quem da ANAC teria condição de fazer isso hoje, pergunto eu? Afora isso, o programa lançaria mais olhos fiscalizadores sobre programas de treinamento e condições de manutenção das aeronaves, principalmente no que se refere à automação, coisa com a qual muita chefia (121) por aí não se sente exatamente confortável.
Andre Sencioles Vitorio Oliveira
9 anos agoPelo título achei que iam colocar um ventilador gigante no aeroporto para dissipar a neblina… :P
Imagino que todas as aeronaves operadas pela Gol e TAM estão homologadas para ILS CAT3.
Se eu não me engano o problema é treinar a tripulação e manter a “experiência recente”.
Lí sobre isso bastante tempo atrás, mas acho que a aeronave tem que efetuar um “autoland” a cada X dias para manter a certificação. Caso contrário ela precisa passar por um processo de verificação.
Nada impede que o “autoland” seja efetuado em condições VMC…
Rogério Aviador
9 anos agoEu também cara. Achei que era um “fan” gigantesco rsrsrs.
augustogentile
9 anos agoA infraero vai disponibilizar um equipamento para auxílio num pouso quase zero por zero (cá entre nós, 175m a 100kt é nada…). Agora quem quiser usar, tem de se adequar. Vai ter empresa dando explicação pra passageiro porque fulano pousou e o nosso não?